sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Sou eu o cadáver esquisito

O Cesaniry estava a pensar em mim e noutras pessoas como eu em dias como o de hoje.

Sou eu o cadáver esquisito porque:

. ainda respiro
. só reajo a 50% os impulsos
. não faço ideia que horas são porque não uso relógio e tenho as janelas fechadas. só sei que é noite
. estou deitada, sem me mexer, e essa é a melhor posição que encontro
. não sei mais nada além disto.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Daqui a uns anos, irei escrever este texto

Daqui a uns anos, irei escrever este texto:


Para o meu filho,

maquilhar-me é sujar os olhos;
fazer teatro é fingir coisas;
bebés são pessoas que não sabem o que são e por isso não podem crescer;
um pirata é um menino sem namorada;
cantar é dizer coisas bonitas como se fossemos anjos;
amar é dar bombons;
Natal é um dia em forma de estrela;
um filme é uma história secreta que agora já se sabe;
abraçar é deixar os corações tocarem-se com roupa no meio;
o pai é um menino com barba e força;
a mãe... é bonita.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

ESTE MEU DESEJO DEVORA-ME (Desconstrução do poema "O Amor em Visita" de Herberto Helder)


Em cena um homem e uma mulher. O homem está no chão, com as mãos atadas. Junto a si, de pé, pisando-o com um dos pés, está a mulher. Homem na defensiva. Mulher violenta, com irónicas mudanças constantes de humor. Uma cadeira bem longe do Homem.

     
Ela: Olha bem para a minha face, aí de baixo.
Olha bem para mim, estás a ouvir, meu amor?

Vou-te cantar a música mais insuportável que fiz para ti.
     
(ajoelhando-se junto da cabeça dele, agarrando-lhe os cabelos) Sabes de que sou feita? De cabelos, de lábios, de ombros, de olhos penetrantes, de seios (ou mamas, como tu lhes chamas), de hálito com cheiro a terra!
Não sou feita de instinto maternal, de morte silenciosa, de pescoço de planta de tão frágil que possa ser.

(Ela dirigindo-se para a cadeira) Eu devo rasgar a minha face para que a tua viva?
Ou devo murmurar cada promessa tua, ó urna?


(Ela senta-se na cadeira) Eu sou aquilo que não se espera que seja.

Para ti já não se erguem mais os meus olhos!
Já não tenho o coração faminto que podia arder por ti…
Se gritei por ti, foi pura loucura…

Os meus pulsos vão-te fazer gritar!

Insistis-te numa violência profunda? Seu bárbaro…
E eu insisti em superstições, espantada com o teu fogo…

Fui mais que tua mãe!
Sabes o que és?
Um deus esmagado e acendido!
(E tão bom que é ver-te a arder…)

Ele: Ah, cabra!

Ela dá-lhe um estalo

Ela (murmurando): Shhhhh! Tu és o silêncio. Não podes gritar! (Ri-se)

Eu sei que és inocente. Eu sei que és cego, abstracto, pobre… eu sei! (Ri-se)

Desejo agarrar na tua cabeça áspera e dobrá-la para dentro do mar. Depois adivinho o teu rosto divino impresso no lodo… e então podes morrer…

(Ela dirigindo-se a ele com um lençol branco, tapando-o) Vais dormir num lençol mordido por bichos que se inclinam para dentro do teu sono…e não vais dormir! (ri-se, saindo de cena)


Texto desconstruído por  Ana Dionísio
Interpretado por Ana Dionísio e André Santos

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

As coisas que ainda não sabes.

Senta-te.
Vou-te ensinar umas coisas que ainda não sabes.

Um dia expliquei-te o conceito de amigo, na esperança de o assimilares de uma forma orgânica. E dei-te um exemplo, o nosso exemplo.
E tu compreendeste.

Um dia expliquei-te o conceito de "amor", na tentativa de me aproximar o mais possível do seu verdadeiro significado. E dei o mesmo exemplo.
E tu compreendeste.

Um dia expliquei-te o que era sonhar, sonhando contigo.
E tu compreendeste.

Um dia quiseste lutar. Eu expliquei-te que a luta era difícil para todos, sem excepção. E tu não compreendeste.

Então senta-te, vou-te ensinar umas coisas que ainda não sabes.

Esqueci-me de te dizer que a amizade, o amor  e o sonho são crianças esfomeadas, uma inocência em constante busca de alimento para seu benefício.

Esqueci-me de te dizer que na luta, o escudo é feito de amizades e amores que se preservam... e sonhos que nunca se deixam de sonhar.

Esqueci-me de te dizer que na luta podes perder um braço, mas nunca o coração.

Esqueci-me de te dizer que podes fazer tudo o que quiseres, com a força que desejares, mas que força a mais magoa.

Não,não te levantes já.
Ainda me falta ensinar-te umas coisas que ainda não sabes.
Não, não sabes.
E eu esqueci-me de te dizer que nem tu, nem eu, sabemos tudo. Estamos muito longe disso. Mas deveríamos saber muita coisa que por qualquer motivo, tu por uns, eu por outros, nos recusamos a saber.

Não sabes que a partida para uma luta tem, por trás de si, um passado que te levou a lutar.

Também não sabes que o teu passado vê muito bem o teu presente - tem vista priveligiada.

Nem sabes que o passado, apesar de passado, sente.

Eu venho do teu passado. Imponho-me no teu presente.
Mas se continuas a insistir que essa luta é assim como a pensas, eu não estarei no teu futuro.

E depois quero ver quem se sentará a explicar as coisas que ainda não sabes.

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

e eu derreto-me...




- Porque é que não me ofereces flores?
- Porque elas morrem.
- Eu também morro.
- Não, tu és para sempre!


Saem-lhe estas palavras, e hoje não é dia dos namorados.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Avó, não ficaste. escrito a 10/11/2007

(estava a reviver memórias antigas e encontrei isto. E sinto tantas saudades tuas avó...)


Foste-te embora na segunda-feira, às 6 da manhã.
Tinha planeado ir ter contigo à noite, para te dar um beijo cheio de saudade e mostrar-te o sorriso que sempre existe ao teu lado.
Não esperaste, e eu devia estar zangada contigo. Mas não consigo. Quem sou eu para me dar a isso? Fui egoísta, fugi de tanta coisa... e não vim a tempo. Como te tinha dito há uns dias, aqui mesmo, no meio das palavras, ainda havia muita coisa para ver-mos as duas...
Confesso que me entristece saber que não vais comigo ver a minha casa, nem vais dar-me um beijo no dia do meu casamento, por veres que a tua menina cresceu, é mulher, e ama alguém que fará com que as tuas raízes continuem por aqui, neste mundo injusto e sujo. Gostava de acreditar que estás a olhar para mim... lá no fundo, sei que estás, mas ando demasiado racional para acreditar no mais óbvio. Desculpa se alguma vez te fiz chorar, se alguma vez fui egoísta e não fui ter contigo porque tinhas saudades minhas.
Guardarei cada palavra tua, cada sorriso e expressão que mostraste.
Obrigada pela mulher que foste.


Sinceramente, ainda penso que é mentira, e vou chegar a tua casa e ver-te de avental posto e a dizeres: Olha, a minha Anita!!

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Convence-me que é ficção

Convence-me que é ficção. Por favor, senta-te comigo e fala, apenas tu.
E diz que "o que vês não é a verdade, a verdade é aquilo que sempre conheceste. Agora mais forte que nunca, mais certa do que alguma vez foi..."

Eu não vou ceder, mas vou sentir.
Não vou correr, mas vou querer ir...
Contigo.
Mas não vou ceder.

Sinto-me motivada a cada instante para me deixar levar pelos bons pensamentos que me surgem.
Mas... tenho medo.

Sentes-te mudado?
Sentes que tudo mudou? E mudou porque tinha realmente que mudar?

Eu... eu sinto que não tinha de ser assim.

Podias voltar a sorrir só para mim, amor...
Voltar a correr para mim... amor.

Eu dou-te tempo. Dou-te todo o tempo.

(Há mais tempo para dar? Ou eu engoli-o?)

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Tempo de partir

Escrevi o texto que se segue imediatamente após um exercício inserido no método de Stanislavski, proposto por Cristina Carvalhal. O texto base é "A Gaivota" de Tchekov, e a personagem-base é a Nina.

O desafio era andar pelo espaço, deixando invadir a mente com as imagens que o texto provoca, e passá-las para o corpo. 



Sentei-me sozinha.
Procurei um peito. (Não... não é isto!)
Tenho-o. (Não é este!)

Onde estás?
Onde está?

Está tudo igual... “Homens, leões, águias e perdizes...”
“Todas as vidas, todas as vidas, todas as vidas...”

Vou para Moscovo!

Preciso de..
De ti?
Não! Não te amo.
Não fico! Não te amo!!!

Eu amo-o...
Eu amo-o...
Eu amo-o...
                             
Ele não é? Não, é! É!

Deixa-me.
Eu vou sozinha.

Observo tudo ao longe.
Tudo me é próximo e está tão...

Tenho vergonha. Tenho medo.
Queres ver-me? Sinto o corpo pequeno só de imaginar que não me vais reconhecer.

Precisei de um peito. Tu, eu sei que mo darias.
Mas...
Não é o teu.

Quero chorar. Por dentro choro todos os dias.
Mas não... só contigo.

Ele fez-me mal?
Sei.
Mas amo-o.

Não me culpes. Não me odeies.
Não sou capaz de te amar.
Por tudo o que me dizes, por tudo o que não me dizes... mesmo assim...

Amo-o.

Por isso, é tempo de partir.


Ana Dionísio